Primeiro caça Gripen brasileiro é entregue na Suécia

Claudia Wallin, enviada especial a Linköping, na Suécia “Este é um momento histórico”, declarou nesta terça-feira (10) na Suécia o ministro da Defesa do Brasil, general Fernando Azevedo e Silva, na cerimônia oficial de entrega do primeiro caça Gripen brasileiro para o início da campanha de ensaios em voo. O contexto de corte de verbas anunciado pelo governo não parece preocupar os interlocutores suecos.
Sob um céu nublado, um show aéreo da aeronave brasileira marcou a cerimônia na sede da fabricante sueca Saab, em evento que reuniu cerca de 300 autoridades suecas e brasileiras – entre elas o comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), tenente-brigadeiro do ar Antonio Carlos Moretti Bermudez, e o ministro da Defesa sueca, Hultqvist. Apesar do forte contingenciamento anunciado este ano para as Forças Armadas, que prevê corte orçamentário específico de 52,6% em relação ao programa de desenvolvimento do Gripen, o ministro Azevedo e Silva afirmou que o orçamento será revisto. “Estamos ainda na fase de diretrizes orçamentárias, e realmente as previsões iniciais não são boas, não apenas em relação a esse programa, e sim a todos os projetos das Forças Armadas. Mas o governo e a equipe econômica, atendendo a diretriz do presidente (Jair Bolsonaro), estão revendo esse orçamento para o ano que vem, de modo que a gente não possa ter uma defasagem em relação a esses projetos, que são importantes e que já são iniciados. Então, tenho certeza de que a expectativa será boa para o próximo ano”, disse o ministro em entrevista a jornalistas brasileiros.
“O presidente Bolsonaro está ciente, como militar e principalmente como parlamentar, que por 27 anos sempre defendeu as causas das Forças Armadas”, acrescentou o ministro. Suécia não teme possível bloqueio no orçamendo Em entrevista coletiva aos jornalistas após a cerimônia, Jonas Hjelm, chefe da área de aeronáutica da Saab, negou que a fabricante sueca esteja preocupada com um eventual bloqueio orçamentário que ofereça riscos à continuação do desenvolvimento dos caças. “Minha resposta é curta – simplesmente ‘não’”, disse o executivo da Saab. “Temos um diálogo muito bom com as Forças Armadas brasileiras, e portanto não estamos preocupados – nem a curto, nem a longo prazo”. O comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro do ar Antonio Carlos Moretti Bermudez, destacou que o Gripen passa a ser “a espinha dorsal da aviação de caça no Brasil”, e que o planejamento estratégico deve prever a compra de um segundo lote de caças Gripen, além das 36 aeronaves já encomendadas.
Autoridades políticas e militares do Brasil e da Suécia participaram da cerimônia de entrega do caça Gripen
Foto: Claudia Walin
“Não temos ainda um número específico. Vamos aguardar as primeiras 36 aeronaves chegarem a partir de 2021 e equipar as primeiras unidades. Aí sim partiremos para a atualização desse desenvolvimento estratégico junto ao ministério da Defesa”, disse Antonio Carlos Moretti Bermudez. Bermudez observou que este tem sido um período positivo para as Forças Armadas. “Em dezembro passado, lançamos o primeiro submarino convencional. Na semana passada, tivemos a entrega do primeiro KC-390, aeronave que será muito útil para as Forças Armadas brasileiras, não só para a Aeronáutica, mas também para a Marinha e o Exército. Então, estamos vivendo um bom momento em relação à defesa e às Forças Armadas”, afirmou o chefe da FAB. A cerimônia de entrega do caça para a fase de ensaios em voo ocorreu quinze dias após o voo inaugural em Linköping do primeiro caça Gripen brasileiro – resultado da parceria entre a fabricante sueca Saab e a Embraer, com participação de outras empresas brasileiras parceiras no projeto. “A entrega do primeiro Gripen ao Brasil é um momento extremamente importante para a parceria estratégica entre Brasil e Suécia”, disse à RFI o ministro da Defesa sueco, Peter Hultqvist. “O Brasil é um parceiro muito importante e valioso para nós. E queremos também expandir nossas relações, com a possibilidade de desenvolver no Brasil o que podemos chamar de um hub para o Gripen na América Latina”, acrescentou o ministro sueco.
A apresentação do Gripen brasileiro durante a cerimônia
Em seu discurso durante a cerimônia, o general Fernando Azevedo e Silva destacou que o primeiro Gripen brasileiro é um marco na história militar do Brasil. “Em 1958, foi aqui, nos campos da Suécia, que o Brasil mostrou ao mundo seu futebol, Garrincha e Pelé. E hoje, este evento marca a entrega desta primeira aeronave, que é um alento para as Forças Armadas brasileiras”, disse o general. Gripen brasileiro também poderá ser um produto de exportação “A sinergia entre Brasil e Suécia no projeto Gripen é sólida, e é forte. Temos discussões avançadas em andamento para a comercialização do Gripen E em diversos países, que poderão beneficiar nossos parceiros brasileiros”, disse Fredrik Gustafson, presidente da Saab na América Latina. ”O ministério da Defesa da Colômbia já indicou que a decisão sobre a escolha dos caças para a renovação de sua frota terá que ser tomada dentro de cerca de um ano e meio, e a situação é semelhante em países como a Finlândia e o Canadá. Estes são, por exemplo, mercados em potencial para o Gripen E, desenvolvido em conjunto com nossos parceiros no Brasil”, completou.
Discurso do ministro da Defesa brasileiro na sede da Saab em Linköping
A entrega do primeiro caça supersônico brasileiro para a fase de testes ocorre cinco anos após a assinatura do contrato de compra pelo Brasil de 36 aeronaves do modelo sueco Gripen. A cerimônia teve ainda a presença do comandante da Força Aérea sueca, general Mats Helgesson, e outras autoridades suecas e do grupo Saab, além do embaixador brasileiro na Suécia, Nelson Antonio Tabajara de Oliveira, e de representantes das empresas brasileiras Akaer, Atech e AEL Sistemas – que atuam como parceiras no desenvolvimento do Gripen. A principal diferença em comparação com as aeronaves de teste anteriores é que o primeiro Gripen brasileiro dispõe de um cockpit com layout totalmente novo, com a tela panorâmica Wide Area Display (WAD), dois pequenos Head Down Displays(sHDD) e um novo Head Up Display (HUD). Outra diferença é um moderno sistema de comando de voo (do inglês flight control system, FCS), além de algumas modificações no hardware e no software. O primeiro caça brasileiro a abrir a campanha de testes é a versão monoposto (para um piloto) da aeronave, o Gripen E. Brasil e Suécia também trabalham juntos para projetar um caça de dois assentos, o Gripen F – um modelo maior, mais pesado e com diversas alterações nos sistemas de aviação e na aerodinâmica do Gripen NG sueco original, que está sendo desenvolvido especialmente para a FAB. O modelo biposto vai permitir que um segundo piloto atue como coordenador de outras aeronaves em missões específicas, e também será usado para treinamento de pilotos. Brasileiros treinados na Suécia A partir do próximo ano, pilotos brasileiros farão o treinamento na Suécia. Serão duas aeronaves de teste 100% nacionais: uma monoposto e outra biposto. Os testes efetuados nos demais aviões de teste do Gripen E (chamados 37-8, 37-9 e 37-10) também já certificaram os sistemas táticos, como o sensor IRST (Infra Red Search and Track) e o radar AESA. A versão brasileira do Gripen conta com modernos sistemas embarcados, radar de última geração e capacidade para empregar armamentos de fabricação nacional. Com 15,2 metros de comprimento e 8,6 metros de largura, o caça multiemprego é uma aeronave de última geração que atinge mais de duas vezes a velocidade do som, e suporta até nove vezes a força da gravidade durante manobras. O cockpit é 100% digital, e com suas armas teleguiadas o caça pode atacar e destruir alvos aéreos, marítimos e terrestres, 24 horas por dia, em qualquer condição meteorológica. A aeronave é capaz de levar até 6.5 toneladas de armamentos, incluindo mísseis de médio e longo alcance e bombas guiadas a laser. A partir de 2021, será entregue à FAB o primeiro lote do total de 36 caças encomendados. Em 2023, segundo o cronograma, começam a ser entregues os aviões que estão sendo montados no Brasil. Todos ficarão sediados em Anápolis, no interior de Goiás, podendo operar a partir de pistas de pouso espalhadas em todo o país. De acordo com o contrato assinado em 2014, o Brasil receberá 28 caças da versão monoposto (Gripen E), e oito unidades do modelo de dois assentos (Gripen F). Os 36 caças serão produzidos de três formas: nesta primeira etapa, parte das aeronaves – que na FAB serão denominadas de F-39 E/F – estão sendo desenvolvidas integralmente na Suécia pela Saab, com acompanhamento de técnicos e engenheiros brasileiros. Em uma segunda fase, os brasileiros montarão o caça inicialmente na Suécia, com o apoio dos suecos. Na fase final, os jatos serão construídos em solo brasileiro, com suporte da Saab. Esta integração faz parte da ampla transferência de tecnologia prevista em contrato, que irá capacitar a indústria aeroespacial brasileira a desenvolver e produzir caças supersônicos no Brasil. Assim, os brasileiros também poderão passar a serem fornecedores de aviões de combate de última geração. O setor de Defesa da Embraer não entrou na versão final do acordo de compra da empresa pela Boeing. Depois da venda para a Boeing, portanto, as divisões de aviação executiva e defesa e segurança permanecem na Embraer, sob controle nacional. A Boeing assumirá o controle de 80% da divisão comercial da Embraer, que passará a se chamar Boeing Brasil – Commercial No total,15 aeronaves vão ser fabricadas no Brasil, incluindo as oito unidades de dois lugares. A produção final será feita no complexo industrial da Embraer em Gavião Peixoto, no interior paulista. Ao longo do programa, 350 engenheiros da Embraer e de outras empresas brasileiras que atuam no desenvolvimento do Gripen E/F serão treinados na Suécia. Entre as outras parceiras brasileiras estão a AEL, que desenvolveu a tela de controle do cockpit, e a Akaer, responsável pelo projeto da nova fuselagem traseira do avião. Até o momento, quase 200 brasileiros já passaram pelo treinamento e regressaram ao Brasil. A maior parte deles trabalha junto a engenheiros suecos no GDDN de Gavião Peixoto, que é o pólo da transferência da tecnologia da Saab para os parceiros brasileiros. É ali que o Gripen F, a versão de dois lugares do Gripen, está sendo desenvolvido. Processo iniciado no governo FHC O processo de concorrência para a compra dos novos caças foi iniciado em 1998 no governo Fernando Henrique Cardoso, com o objetivo de substituir a frota de caças Mirage. O projeto FX previa a compra de 12 supersônicos e deveria ter sido assinado até 2004, mas a decisão foi adiada para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que lançou em 2008 o programa FX-2. O Gripen foi escolhido pelo governo brasileiro como o novo caça da FAB em 18 de dezembro de 2013, após vencer uma concorrência com jatos da França e dos Estados Unidos no âmbito do programa FX-2. O contrato para a compra dos caças, no valor de US$ 4,05 bilhões (R$16,6 bilhões), foi assinado em outubro de 2014.
10 de Setembro de 2019

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *