Claudia Wallin
De Estocolmo para o Diário do Centro do Mundo
Jaz há dez meses na mesa de trabalho do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o processo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4.650, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) com o fim de proibir as doações de empresas a campanhas políticas. E ainda não se vislumbra no horizonte uma data para que o ministro devolva o processo para a retomada do julgamento no plenário do STF, onde a maioria dos integrantes chegou a votar a favor da ação em abril de 2014.
“Isso é um tempo que depende dele (Gilmar Mendes)”, disse nesta segunda-feira na capital sueca o presidente do Superior Tribunal Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo, José Antônio Dias Toffoli.
“O ministro Gilmar Mendes tem uma posição, já publicamente declarada, de que proibir as empresas de participar com doações a campanhas eleitorais poderia criar uma situação de caixa dois de campanha. Ele tem uma outra visão, ele pensa que é necessário colocar alguns limites, e está preparando seu voto”, acrescentou.
O julgamento entrou em estado de paralisia desde que o ministro Gilmar Mendes pediu vistas do processo – e o fato de o regimento interno do Supremo Tribunal estipular um prazo de 30 dias para a devolução do processo é uma regra que parece primar pela flexibilidade.
“Sim, o regimento interno fala de 30 dias. Mas como nós temos muitos casos para julgar, isso acaba sendo apenas um objetivo. Não há uma obrigação de cumprir este prazo”, afirmou Dias Toffoli, após realizar conferência sobre o sistema eleitoral brasileiro no Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral (International IDEA), sediado em Estocolmo.
Mas dez meses não seria tempo suficiente para refletir?
“Ele (Gilmar Mendes) tem todo o tempo para pensar e refletir”, disse o presidente do TSE.
Na visão de Dias Toffoli, a discussão da Ação 4.650 deve ser feita com calma:
“Embora eu já tenha votado a favor da proposta, penso que não adianta também o Judiciário tomar uma decisão para em seguida o sistema político reagir. Como já ocorreu, por exemplo, em 2002, quando o TSE estabeleceu a necessidade de as coligações partidárias locais corresponderem à coligação nacional. O que aconteceu então foi que o Congresso Nacional editou uma emenda constitucional, permitindo a plena liberdade de coligação. Essa reação, entre outras razões, criou a situação que nós vimos nas eleições de 2014, com 28 partidos representados no Congresso Nacional. Ou seja, a reação política acabou gerando uma situação muito mais difícil e complexa. Portanto, penso que o melhor caminho é uma discussão conjunta com o Parlamento, para que possamos criar uma solução mais perene para esse grande problema.”
O ministro destacou, porém, que vê o financiamento empresarial das campanhas eleitorais como um “grande problema”. Nas eleições de 2014, segundo ele, 95% dos gastos de campanha dos 12 candidatos à presidência da República foram financiados por empresas privadas.
“Nas eleições gerais como um todo, como não existe um teto para os gastos, as empresas financiaram mais de 90% das campanhas. Só 2% foram bancados por pessoas físicas, e 3% pelo Fundo Partidário (repassado aos partidos políticos pela União)”, destacou Dias Toffoli.
A uma seleta platéia formada por diplomatas, juízes e acadêmicos reunidos na sede do International IDEA, Dias Toffoli explicitou sua oposição ao financiamento empresarial de campanhas políticas:
“Empresas não votam. Quem vota é o povo. Mas quando a democracia vence, o capital tenta capturar a democracia através do dinheiro. Este é um problema que existe em todo o mundo”, disse o ministro.
Ele destacou em seguida a fragmentação do sistema político brasileiro. “Dos 32 partidos políticos brasileiros, apenas quatro não têm representação no Congresso. Vocês podem imaginar que não é fácil ser presidente da República no Brasil”, comentou, provocando risos na audiência.
Ao final da conferência, o presidente do TSE esquivou-se de comentar as críticas feitas no dia 14 de fevereiro pelo ex-presidente do STF Joaquim Barbosa ao ministro da Justiça, pelo fato de José Eduardo Cardozo ter se reunido com advogados das empreiteiras investigadas pela Operação Lava-Jato.
“Não leio jornal no carnaval”, sorriu o ministro.
Pelo Twitter, relembro, Joaquim Barbosa escreveu: “Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o Ministro da Justiça.
“Eu não vou comentar isso”, rebateu Dias Toffoli.
Claudia Wallin, jornalista brasileira radicada na Suécia, é autora de Um país sem excelências e mordomias.
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Claudia Wallin
Sobre o Autor
A jornalista brasileira Claudia Wallin, radicada em Estocolmo, é autora do livro Um país sem excelências e mordomias.