Claudia Wallin, de Estocolmo para a Rádio França Internacional
Em uma das eleições mais dramáticas da história democrática da Suécia, os resultados do pleito de domingo confirmaram o retrocesso recorde da social-democracia no cenário político – mas apesar do avanço da extrema-direita, as projeções de que o partido anti-imigração Democratas da Suécia se converteria na segunda maior força política do país não se concretizaram.
O Partido Social-Democrata se mantém como a maior sigla do país, mas sua posição fica mais vulnerável: os social-democratas, que têm dominado a política sueca desde a década de 30, registraram o seu pior resultado eleitoral dos quase cem anos de democracia sueca, com 28,4% da preferência do eleitorado. O número representa um encolhimento de 2,8% em relação às últimas eleições.
“Os eleitores nos escolheram mais uma vez como o maior partido do país. O fato de que um partido com raízes neonazistas (o Democratas da Suécia) tenha ganhado tanto terreno me deixa desapontado. A única coisa que tal partido tem a oferecer é o aumento do ódio. Temos a responsabilidade moral de demonstrar que um outro tipo de sociedade é possível“, disse o primeiro-ministro social-democrata, Stefan Löfven, em discurso a uma platéia de militantes do partido após o anúncio do resultado.
No embate dominado pela polarização do país em torno da questão da imigração e da integração, o partido anti-imigração Democratas da Suécia teve um novo salto em sua ascensão política, com 17,6% dos votos, mas retém a posição de terceira maior agremiação do Parlamento.
“Somos os grandes vencedores dessas eleições. Aumentamos o número de cadeiras do partido no Parlamento, e teremos enorme influência na política sueca nas próximas semanas, meses e anos. E ninguém pode tirar isso de nós”, disse o líder do Democratas da Suécia, Jimmie Åkesson, entre aplausos da militância.
Na reta final da contagem dos votos, o conservador Partido Moderado superou a ameaça da extrema-direita e conseguiu reter a posição de segunda maior força política do país, com 19,8% dos votos – mas com uma queda de 3,5% em relação ao pleito de 2014. Após a divulgação do resultado, o líder do partido, Ulf Kristersson, pediu a renúncia imediata do primeiro-ministro Stefan Löfven.
“Este governo já se esgotou”, disse Kristersson.
O primeiro-ministro Stefan Löfven já recusou a possibilidade de renúncia. Sem que os dois tradicionais blocos políticos liderados pelos social-democratas e o Partido Moderado tenham alcançado maioria suficiente de votos, entretanto, o cenário para a formação de um novo governo é incerto.
O índice de comparecimento às urnas foi de 84,4%. Apesar de as previsões sobre uma ascensão exponencial da extrema-direita não terem se confirmado, o Democratas da Suécia foi o partido que mais cresceu nestas eleições. Com a obtenção de 62 das 349 cadeiras do Parlamento, o partido teve um desempenho significativo em relação às eleições de 2014, quando obteve 12,9% dos votos.
Fundado em 1988 por ativistas ligados a grupos neonazistas, o partido Democratas da Suécia entrou no Parlamento sueco pela primeira vez em 2010, com 5,7% dos votos. Nos últimos anos, a sigla soube explorar a seu favor as inquietações de parte da população com o crescimento da imigração no país, principalmente a partir da chegada de 163 mil imigrantes à Suécia no auge da crise dos refugiados de 2015 – a maior recepção per capita de imigrantes entre todos os países da Europa.
Mais recentemente, cenas de violência e carros incendiados nos subúrbios menos favorecidos, habitados por uma maioria de imigrantes, alimentaram as tensões – apesar de o governo social-democrata ter adotado políticas mais restritivas de imigração desde 2016.
Na mídia sueca, analistas classificaram as eleições gerais deste ano como uma espécie de referendo sobre a questão da imigração e da integração. Historicamente, as campanhas políticas na Suécia têm se concentrado em temas relacionados ao bem-estar social, como melhorias na educação e na saúde.
Este ano, a campanha foi marcada pelo debate em torno do influxo de refugiados e o desafio de integrar os imigrantes à sociedade sueca, além da necessidade do reforço da lei e da ordem – com maiores verbas para a segurança pública e a contratação de mais policiais. Deficiências no sistema de saúde também figuraram entre os principais problemas citados pelos eleitores nestas eleições.
Na visão do primeiro-ministro social-democrata, Stefan Löfven, é preciso investir em novos programas de integração para refugiados em comunidades marginalizadas, a fim de oferecer aos imigrantes oportunidades de acesso à educação e ao trabalho. Para os apoiadores da social-democracia, o voto contra a extrema direita foi um voto em defesa da solidariedade e dos valores mais fundamentais da democracia sueca.
Já para o líder do Democratas da Suécia, Jimmie Åkesson, a entrada de 400 mil imigrantes no país desde 2015 representa uma ameaça à cultura sueca e ao Estado de bem-estar social.
Antes tratado como um pária pela maioria da população, Åkesson aumentou sua base de apoio nos últimos tempos a partir de uma estratégia destinada a repaginar a imagem do partido, com a expulsão de militantes radicais e declarações de rejeição ao nazismo.
O avanço da extrema-direita na Suécia reforça a tendência em curso na Europa, onde partidos populistas e anti-imigração já chegam a integrar os governos de países como Itália, Áustria, Finlândia e Noruega.
Apesar da votação expressiva conquistada pela extrema-direita, porém, a participação do Democratas da Suécia na composição de governo continua a ser sumariamente rejeitada pelos partidos tradicionais: líderes de todas as siglas têm se recusado a dialogar com os extremistas, a quem acusam de promover o racismo e a xenofobia na tradicionalmente aberta e tolerante sociedade sueca.
A situação é de impasse político: a diferença entre os votos conquistados pelos dois maiores blocos políticos é de apenas três pontos percentuais – o que significa apenas uma cadeira no Parlamento. O bloco de esquerda, composto pelos partidos Social-Democrata (24,8% dos votos), Verde (4,3%) e de Esquerda (7,9%), obteve 144 assentos no Parlamento. Já o bloco da centro-direita, formado pelos partidos Conservador (19,8% dos votos), Liberal (5,5%), Centro (8,6%) e Democrata-Cristão (6,4%) alcançou 143 cadeiras.
Nenhum dos dois blocos tem, portanto, a maioria de 175 assentos necessária para formar o próximo governo.
Se os líderes partidários mantiverem a promessa de neutralizar a influência da extrema-direita na tentativa de compor um novo governo, será necessário costurar algum tipo de aliança entre partidos dos dois tradicionais blocos rivais da política sueca.
A previsão é de que as negociações para a composição do novo governo sueco devem se arrastar pelas próximas semanas.
10 de Setembro de 2018