Interior da Câmara Municipal de Estocolmo / foto oficial
[av_hr class=’invisible’ height=’50’ shadow=’no-shadow’ position=’center’ custom_border=’av-border-thin’ custom_width=’50px’ custom_border_color=” custom_margin_top=’30px’ custom_margin_bottom=’30px’ icon_select=’yes’ custom_icon_color=” icon=’ue808′ font=’entypo-fontello’]”Ser vereador é um trabalho voluntário, que pode ser perfeitamente realizado nas horas vagas” – Christina Elffors-Sjödin
”Moro no subúrbio, tomo o trem até a Estação Central de Estocolmo e de lá caminho cerca de dez minutos até a sede da Câmara” – Christina Elffors-Sjödin
O impactante interior da Câmara Municipal de Estocolmo é uma curiosa explosão de contrastes. Três gigantescos candelabros dourados dominam o aristocrático salão do plenário, coberto por tapetes vermehos e emoldurado por cortinas no mesmo tom. As galerias em madeira maciça e o pódio da presidência da Câmara, coroado por um cortinado em tecido vermelho drapeado, completam o ar palaciano do ambiente. Mas quando se olha para cima, na altura quase vertiginosa do salão, o simbolismo da era viking rouba a cena.
O teto da Câmara representa um navio viking virado para baixo. Diz-se que, para evitar ataques inconvenientes ao atracar em terras desconhecidas, os antepassados dos suecos costumavam se reunir sob o teto de seus barcos virados, a fim de planejar em paz suas pilhagens. As intenções eram pouco nobres. Mas os vikings também entraram para a história como um povo que tomava suas decisões em conjunto, para o bem ou para o mal.
Através do casco do navio viking retratado na Câmara, vê-se a pintura de um céu azul: um símbolo para lembrar que todas as decisões tomadas na Casa são transparentes e devem ”voar” em direção ao povo. Para simplificar a idéia delirante, todas as sessões da Câmara são abertas ao público.
Por uma porta situada no salão do plenário, a vereadora Christina Elffors-Sjödin me conduz à sala de reuniões da Câmara. Pede desculpas por não ter sala própria nem café para oferecer, e conta como é trabalhar ao mesmo tempo como diretora de uma creche e vereadora do Partido Moderado.
. O que a senhora acha do fato de trabalhar como vereadora desde 2006 sem receber salário?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Acho bom, porque penso que não devemos ter vereadores pagos.
. Por que não?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Porque estamos aqui exercendo a nossa cidadania, em uma atividade que não exige dedicação em tempo integral, e portanto não devemos ser pagos por isso. Se pagássemos salários a vereadores, muitos estariam aqui não por causa de um comprometimento para mudar as coisas para melhor, e sim para ganhar dinheiro e fazer carreira. Seria, então, um trabalho. E não acho que ser vereador é um trabalho.
. O que é ser vereador?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: É um trabalho voluntário, que pode ser perfeitamente realizado nas horas vagas. Para isso, temos uma pequena gratificação, que na verdade tem um valor extremamente baixo, mas é suficiente. Para receber salário, trabalho como diretora de uma creche em tempo integral.
. Por que um vereador não deve trabalhar em tempo integral e receber salário, como os deputados do Parlamento sueco?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Porque eles (os deputados do Parlamento sueco) trabalham muito mais do que eu. Eles representam todo o país. Eu represento apenas Estocolmo, e não há uma carga de trabalho que justifique o trabalho remunerado em tempo integral.
. A senhora não tem gabinete nem assistentes, e trabalha de casa. Conta com algum tipo de assistência para sua função como vereadora?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: O apoio que tenho vem de dois funcionários do meu partido, que têm como função auxiliar todos os 38 vereadores da sigla.
. Que tipo de apoio dão esses dois funcionários?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Principalmente em termos de relações com a mídia e assessoria de imprensa. Se eu precisar de alguma informação específica, ou de uma consulta ao prefeito a respeito de alguma questão importante, estes dois funcionários também fornecem assistência e material de background.
. A senhora não recebe nenhum tipo de auxílio-transporte. Como paga por seus deslocamentos na cidade como vereadora?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Bem, é também para esse tipo de gasto que ganhamos a pequena gratificação mensal da Prefeitura, de 1.533 coroas suecas (cerca de 235 dólares). Mas como preciso trabalhar na creche todos os dias, uso na verdade o cartão que dá direito a utilizar os transportes públicos, que compro com meu próprio salário.
. Que tipo de transporte a senhora usa para vir à Câmara Municipal?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Trem. Moro no subúrbio, tomo o trem até a Estação Central de Estocolmo e de lá caminho cerca de dez minutos até a Stadshuset (sede da Prefeitura e da Câmara). Todos os vereadores têm também direito a pegar um táxi quando as sessões na Câmara acabam depois das 10 da noite. Mas se a sessão acaba dez minutos antes das dez da noite, não podemos tomar táxi.
. Como também não tem direito a celular, a senhora também precisa pagar do próprio bolso para fazer ligações relacionadas ao trabalho como vereadora?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Uso o meu próprio telefone celular. Todos na Suécia têm um celular. E não custa tanto assim fazer ligações extras do próprio telefone.
. Quanto tempo por semana a senhora dedica às atividades como vereadora?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: São em média cinco horas por semana. A leitura de documentos e propostas é a tarefa que mais consome tempo. Também dedico tempo para responder aos muitos emails que recebo de eleitores, com perguntas e solicitações sobre questões diversas.
. Pode descrever como é o seu trabalho como vereadora, e que tipo de tarefas executa?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: As sessões na Câmara são realizadas a cada três semanas, entre quatro da tarde e dez da noite. Escrevo meus próprios discursos, faço visitas a associações, encontro eleitores e leio uma quantidade considerável de documentos e propostas. Como meu partido detém a maioria na Casa, apenas os vereadores da Oposição apresentam moções. As propostas do meu partido, que são apresentadas durante a campanha eleitoral após deliberações com diferentes segmentos da sociedade, são elaboradas diretamente pelo gabinete do prefeito. Por exemplo, durante a campanha apresentamos uma proposta para construir mil casas em Estocolmo por ano. Quando somos eleitos, o prefeito e os vice-prefeitos dialogam com setores da comunidade para determinar onde as habitações devem ser construídas. Os vereadores votam, então, aspectos específicos em torno desta e de outras questões.
. Não há então a necessidade de trabalhar como vereadora de Estocolmo em tempo integral?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Absolutamente não. Cinco horas por semana são suficientes.
. A senhora tem uma família, trabalha em tempo integral como diretora de uma creche e desempenha a função de vereadora. Como consegue equilibrar tudo isto?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Tenho um marido muito compreensivo, que não está envolvido em política (risos). Era mais complicado quando a minha filha era pequena, e eu desempenhava a função de conselheira distrital, que tomava entre 25 e 30 por cento do meu tempo. Mas atualmente minha filha já é crescida, e o trabalho de vereador não é tão absorvente como o de conselheira distrital.
.Tem algum tipo de ajuda com as tarefas domésticas?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Sim, uma faxineira. Uma vez por mês.
. O que a levou a entrar na política?
CHRISTINA ELFFÖRS-SJÖDIN: Eu queria ter uma escola do método Montessori para minha filha, mas na época não havia nenhuma. Então decidi fundar eu mesma a escola, através de uma cooperativa de pais. Para conseguir subsídios do governo para criar a escola, entrei em contato com diversos vereadores. A partir daí, foi uma bola de neve.
Ao encerrarmos a conversa, saímos do edifício da Câmara Municipal e caminhamos juntas pela movimentada Vasagatan, em meio ao insistente frio de março. Na altura da Estação Central de Estocolmo, Christina se despede. Vai pegar o trem para o subúrbio onde vive.
Ao contrário da experiência de Christina, combinar trabalho, família e afazeres domésticos com a atividade política a nível municipal é, porém, um desafio para parte dos vereadores. Em fevereiro de 2013, reportagem da Sveriges Radio (Rádio Sueca) mostrou que mulheres e jovens eram os mais propensos a deixar a política a nível local. Uma das entrevistadas na reportagem era a enfermeira Louise Wiberg, que tinha 27 anos de idade, um filho no colo e outro ainda na barriga quando se tornou vereadora da localidade de Vara (sudoeste da Suécia) pelo Partido do Centro.
”Eu trabalhava durante o dia num asilo de idosos, e participava de reuniões políticas nas noites de segunda-feira e também às terças-feiras. Para mim é importante participar da vida política e das decisões que determinam como deve ser a sociedade em que vivo. Mas chegou um ponto em que não foi mais possível harmonizar emprego, casa e filhos com a política”, contou Louise à rádio sueca.