Supersalários de juízes: Justiça do Paraná processa e intimida jornalistas que revelaram a conta

RADAR BRASIL

Dane-se a lei de transparência, pela qual a remuneração de juízes e promotores deve ser divulgada – por ser de interesse público.

De Rogério Galindo, da Gazeta do Povo: “Dezenas de juízes do Paraná estão processando a mim e a quatro colegas da Gazeta do Povo por termos revelado quanto eles receberam dos cofres públicos. Não há uma informação errada sequer nas matérias e na coluna que deram origem às ações. Mesmo assim, eles entraram com processos em várias comarcas, obrigando todo mundo a ir em audiências a centenas de quilômetros uma da outra, ficando longe da família, sem poder trabalhar, criando custos para o jornal. E sem poder fiscalizar o poder público. Inclusive o Judiciário. A história não termina aqui: agora eles dizem que não vão ser 30 processos, e sim 300.”

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo denuncia: os processos foram protocolados em Juizados Especiais, o que obriga os jornalistas Chico Marés, Euclides Lucas Garcia e Rogério Galindo, além do analista de sistemas Evandro Balmant e do infografista Guilherme Storck a comparecer a todas as audiências de conciliação. Como há ações em todo o estado, os profissionais já percorreram mais de seis mil quilômetros nos últimos dois meses, atendendo a 18 intimações.

Abaixo, a reportagem dos jornalistas da Gazeta do Povo publicada em fevereiro deste ano e que despertou a ira da Justiça paranaense:

TJ e MP pagam supersalários que superam em 20% o teto previsto em lei

Na média, em 2015 procuradores e promotores ganharam 23% a mais. Juízes e desembargadores ficaram com 28% além do máximo legal

Em 2015, magistrados do Poder Judiciário estadual e membros do Ministério Público do Paraná (MP) receberam, em média, mais de 20% acima do teto constitucional de cada um dos poderes – em valores brutos. A remuneração de juízes, desembargadores, promotores e procuradores foi complementada por indenizações, pagamentos retroativos e auxílios, incluindo o auxílio-moradia.

O teto salarial para membros de ambos os poderes é de R$ 30.471,10 – o equivalente a 90,25% do salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Considerando o 13º e o adicional de férias, isso representaria, em um ano, R$ 411,3 mil, em valores brutos.

Mas, em média, cada magistrado paranaense recebeu R$ 527,5 mil (28% acima do teto), e cada membro do MP recebeu R$ 507 mil (23% acima). Em ambos os casos, mais de um terço disso (38% no Judiciário e 36% no MP) se refere a auxílios, indenizações e pagamentos retroativos, que não são afetados pelo teto.

O auxílio-moradia é um dos fatores que elevam os vencimentos de magistrados e membros do MP acima do teto. Mas não é o único. A rubrica que trata do auxílio equivale a 11% da remuneração bruta dos magistrados e 12% dos promotores e procuradores, e inclui ainda outros auxílios e verbas indenizatórias.

No caso do MP, um fator que elevou significativamente os vencimentos foi o pagamento de retroativos – cerca de 10% do total pago. Durante parte dos anos 90, o salário dos ministros do STF, que serve como referência para os salários de magistrados, procuradores e promotores, foi inferior ao dos parlamentares. Foi criado então, em 1998, o abono variável para compensar essa diferença.

Entre 1998 e 1999, porém, o valor pago em abono era inferior à diferença de salários. O MP continua pagando a diferença até hoje. Em nota oficial, o órgão declarou que houve uma preocupação de fazer esse pagamento aos poucos para “não comprometer outras atividades” da instituição – e, por causa disso, o Ministério Público não quitou esses pagamentos na mesma velocidade que outros estados. Segundo a instituição, “o principal já foi pago” e os juros e correção monetária foram recentemente quitados.

No caso do Tribunal de Justiça (TJ), a rubrica na qual pagamentos retroativos foram incluídos representa 24% do vencimento médio. Porém,a rubrica inclui também diversos outros tipos de pagamento, incluindo 13.º e abono de férias . A reportagem entrou em contato com o TJ, questionou os valores apresentados e perguntou se há situação similar envolvendo a magistratura, mas não teve resposta.

Entre 1998 e 1999, porém, o valor pago em abono era inferior à diferença de salários. O MP continua pagando a diferença até hoje. Em nota oficial, o órgão declarou que houve uma preocupação de fazer esse pagamento aos poucos para “não comprometer outras atividades” da instituição – e, por causa disso, o Ministério Público não quitou esses pagamentos na mesma velocidade que outros estados. Segundo a instituição, “o principal já foi pago” e os juros e correção monetária foram recentemente quitados.

No caso do Tribunal de Justiça (TJ), a rubrica na qual pagamentos retroativos foram incluídos representa 24% do vencimento médio. Porém,a rubrica inclui também diversos outros tipos de pagamento, incluindo 13.º e abono de férias . A reportagem entrou em contato com o TJ, questionou os valores apresentados e perguntou se há situação similar envolvendo a magistratura, mas não teve resposta.

Projeto de regulamentação

A Câmara dos Deputados deve votar nas próximas semanas um projeto de lei do governo federal que pretende regulamentar o teto dos servidores públicos, na tentativa de impedir que gratificações, benefícios e outros “penduricalhos” façam com que o salário de funcionários públicos fique acima do determinado pela Constituição. Hoje, há diversos exemplos de servidores que ganham remuneração acima da dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) graças a manobras contábeis.

A proposta do governo foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara no ano passado, mas com mudanças que, mais uma vez, podem favorecer a “contabilidade criativa” dos três poderes, permitindo que os vencimentos fiquem acima do teto constitucional. No dispositivo que o governo pretende adotar, faz-se uma ampla lista de tudo que pode ser adicionado ao salário e do que está necessariamente limitado pelo teto.

Garantia dos Recursos

A inclusão do Fundo de Participação dos Estados (FPE) na base de cálculo da divisão dos recursos entre os poderes do estado garantiu disponibilidade de recursos para o pagamento dos altos vencimentos de magistrados, procuradores e promotores. Desde 2011, as receitas do FPE são incluídas no bolo a ser distribuído. Em 2015, isso representou R$ 428 milhões a mais para o Tribunal de Justiça (TJ), o Ministério Público (MP), o Tribunal de Contas (TC) e a Assembleia – e, logicamente, R$ 428 milhões a menos para o governo.

No Ministério Público Estadual (MP), a diferença entre o que foi pago aos membros do órgão e o teto constitucional custou R$ 70 milhões – 74% dos R$ 94,5 milhões ganhos a mais em 2015 com a inclusão do FPE. Já no Tribunal de Justiça, a proporção foi menor. O tribunal recebeu R$ 219 milhões “extras” com o FPE. Os gastos com pagamentos acima do teto constitucional custaram R$ 108 milhões – 49% dos recursos.

 

7 de Junho de 2016

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